“A lei é igual para todos. Também a chuva molha todos, mas quem tem guarda-chuva abriga-se.” (Francesco Carnelutti)

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

É direito de toda cidade ter sua cracolândia!

Esta será minha primeira postagem ao blog e afirmo que minha intenção em criá-lo partiu de visitas a outros blogs de doutores em Direito. Longe de ser doutora e de ter as melhores opiniões acerca das diversas controvérsias da área jurídica, quero, antes de mais nada, expor artigos pertinentes aos estudantes de Direito, assinados pelos melhores estudiosos e que, sem dúvida alguma, irão ajudar a moldar o perfil dos futuros aplicadores do Direito.

Então vamos ao que interessa.

Que a decisão do STF quanto à inconstitucionalidade do art. 44 da lei 11.343/06 vai dar o que falar, disso ninguém tem dúvida, mas na prática, longe do banco dos réus, é imaginável o que nos espera?

Bom, tudo bem que não teremos uma revolução, afinal de contas as revoluções ocorrem quando o povo se une e resolve lutar por ideais, as drogas estão longe disso. O que veremos com a benesse concedida pelo STF aos traficantes é o atraso e a maior dificuldade no combate, principalmente, ao crack, que alguns acreditam já se tratar de uma epidemia, não sem razão.

Atraso porque todo o trabalho desenvolvido por ONG´s, fundações e outras instituições engajadas nessa luta, irá competir com o vício forte, devastador, sedutor e acima de tudo indestrutível. Todos sabem que uma vez viciado, sempre viciado, você não consegue destruir seu vício, aniquilar sua vontade de consumir a droga, desaparecer com o desejo de "dá um teco". O viciado/dependente, que diga-se de passagem difere do usuário, luta todos os dias para controlar seu desejo, seu vício. Os viciados, durante e após tratamento, vivem um constante PHN - por hoje não! Um dia de cada vez. E ainda assim não são raros os casos daqueles que saem de clínicas de reabilitação pela 3ª ou 4ª vez, e talvez nem passe por sua cabeça que essa saída terá uma 5ª vez, uma 6ª vez... A maior dificuldade reside exatamente aí, em como fazer com que essas saídas diminuam, não no sentido de manter uma internação perpétua, mas sim no sentido de não precisar ser internado novamente. E não quero nem citar aqui os casos das gestantes que consomem crack e dão a vida a crianças que já nascem viciadas. Reservo-me a não discutir essa questão em prol da minha saúde emocional.

Mas, afinal o que isso tem a ver com a decisão dada por nossa Corte Suprema?

A decisão tomada pelo STF concede aos condenados por tráfico ilícito de entorpecentes o direito a ter sua pena privativa de liberdade substituída por uma pena restritiva de direitos, leia-se, ao invés de ir preso ele estará na creche do bairro prestando serviços à comunidade. E que serviços! Então podemos imaginar que com tantos serviços prestados à comunidade, afinal de contas não são poucos os condenados, teremos mais crianças/adolescentes viciadas? Sim, podemos! Podemos imaginar que aqueles que vivem o PHN terão que fazer um esforço humanamente impossível para resistir ao que é posto a sua frente? Sim, podemos! Podemos imaginar que as instituições engajadas nessa causa definharão? Sim, podemos! Podemos imaginar que com mais serviços prestados e mais e mais serviços, aquelas comunidades esquecidas pelo Estado, que não são poucas, começarão a prestar esses "serviços"? Sim, podemos!

Só para terminar, podemos imaginar que com esses serviços haja realmente uma epidemia do crack e que cada Estado, Capital, Município, Bairro, Viela (...) tenha sua própria cracolância? Infelizmente, podemos!

A decisão do STF abre um precedente perigoso no atual contexto social. Não se trata de interpretar a lei de forma que desrespeite os direitos dos apenados, trata-se primeiro de interpretar a lei colocando-a no seio da comunidade, para que no fim das contas não seja esta a apenada.

Talvez a distância que separa a Praça dos Três Poderes da Cracolândia de Brasília seja bem superior a 2 km.

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